Salve Jorge: uma repetição de clichês |
Nanda Costa ou Nada Consta?: sem carisma para uma protagonista |
É o estilo novelão. Se “Avenida” voltava a trama para o
cinema e seriados, “Salve Jorge” mostra o que consagrou as novelas brasileiras.
A novela começou com paisagens grandiosas da Turquia, o novo cenário e logo de
cara, mostrou uma Morena (Nanda Costa) sendo posta a leilão. É “arrematada” por
alguns mil euros e a próxima é anunciada: “Vejam senhores, que esplendor de
tcheca”. Sim, a novela começou no futuro e voltou, sendo mostrado um “8 meses
antes”. Não lembro outra novela ter utilizado esse recurso. Interessante.
A novela “volta” oito meses no meio de um tiroteio. Morena e
o filho estão no fogo cruzado, quando traficantes e policiais travaram uma
guerra no morro do Alemão, o outro cenário principal da novela. Imagens reais
do conflito mostradas em telejornais se misturaram com as imagens da novela,
garantindo um realismo pouco visto. Sim, tinha cara de documentário. Isso não
tira o mérito, pois a edição foi muito bem construída.
Morro do Alemão tão belo quanto a Capadócia |
A fotografia é típica das novelas de Gloria: grande angular,
com paisagens, contrastes de cores, mas nada inovador. O Alemão e a Turquia são
igualmente belos e grandiosos. A trilha sonora instrumental é grandiosa, digna
dos grandes filmes de batalha. Já a trilha sonora original tenta pegar carona
no popular, com funk, samba e pagode. O baile charme dá lugar ao “pagofunk”,
sai o Divino e entra em cena a favela. Apesar de parecidas, são duas realidades
completamente diferentes. O Divino era um retrato de um bairro, de famílias
que, independentemente da classe social, são parecidas. Já o morro é uma
realidade exclusiva de quem mora lá. Isso pode afastar uma parte do público.
Nem é preciso falar do título, mais segregador do que qualquer outra coisa.
O contraste manjadíssimo de classes também é mostrado. Lucimar
(Dira Paes), a empregada, moradora do Alemão, preocupada com o conflito e Drika
(Mariana Rios), preocupada um futilidades. Drika parece uma versão enriquecida
de Suellen (ísis Valverde, em “Avenida”). Mas a cota “periguete” da novela cabe
à Lurdinha (Bruna Marquezine).
O casal: idas e vindas do amor. O sono bate à sua porta. |
Mas está faltando algo: o protagonista. Théo (Rodrigo Lombardi)
continua canastrão, assim como todos os outros personagens galãs que já fez. Ao
comentar sobre os sonhos que tem na vida, Théo diz “Só? Você acha pouco?”. É
como se quisesse mostrar que a novela é, sim, grande. Ele namora há um mês a
companheira de batalhão Érica (Flávia Alessandra). Numa balada, os dois tem um
diálogo forçado sobre sonhos. Em casa, Lívia debocha de Théo. Uma inversão de
papeis.
Théo é devoto de São Jorge, pois foi soterrado num acidente
quando era crianã. Era dia de Jorge e desde então crê no santo guerreiro. Élcio (Murilo Rosa) será a pedra no sapato de
Théo, já que os dois disputam posições no batalhão. É um invejoso nato. Os
personagens de Gloria são assim: calcados nos estereótipos.
A novela segue uma proposta realista (só aqui, que fique
claro) e mostra a invasão do exército no morro. Novamente imagens de
jornalísticos. E aqui a ascensão social é mostrada de forma veemente: os jovens
estão conectados, comentando a invasão na favela, na zona sul e no escritório. As
famílias do morro têm notebook e TV de LED, smartphones e filmadoras. Isso não
condiz com as tramas fantásticas de Glória Perez.
Seu Jorge, quer dizer, São Jorge caminha sobre as águas. Quer mais fantástico que isso? |
Depois de quase 40 minutos do primeiro bloco, a abertura. De
fato, um dos pontos altos da novela. Seu Jorge (ah vá!) canta a música, com
imagens gráficas incríveis, fantásticos, que misturam a favela com a Capadócia
e um São Jorge galopante sobre águas e tudo o mais. É uma síntese da novela. A
música não chega a ser “chiclete” como um “Oi Oi Oi”, mas agrada. A repetição
de elementos faz lembrar “Caminho das índias”, a novela anterior de Gloria. Veja em: http://tvg.globo.com/novelas/salve-jorge/videos/t/salve-jorge/v/confira-a-abertura-de-salve-jorge/2203083/
O primeiro bloco foi inteiramente dedicado à apresentação do
conflito principal e dos protagonistas Théo e Morena. Já o segundo, dedicado
aos núcleos menores e personagens coadjuvantes. Coadjuvantes de peso. Heloísa
(Giovanna Antonelli) me parece a mais segura no papel, junto com Dira Paes.
Nanda Costa não tem nenhum carisma e não convence como protagonista, mesmo
sendo uma moça humilde, porém forte e barraqueira. Carismática como uma porta.
O merchandisng social foi mostrado rapidamente, com uma Carolina Dieckmann
segura e explicando o “sonho”. Tudo muito rápido.
Lívia (Cláudia Raia): vilã ou cômica? |
E enfim, no terceiro bloco, é apresentada a vilã-mor de “Salve
Jorge”. Lívia (Cláudia Raia) “chega chegando”: se mostra como empresária. Mais
uma ironia: Lívia diz “Não, não estou trazendo nenhum musical”. Raia é
conhecida pelos grandes musicais que estrela. Cláudia Raia fazendo um papel de
vilã é cômica.
E, ENFIM, Istambul, a capital turca é mostrada de fato:
danças, danças, danças. Músicas, músicas, músicas. Expressões, expressões,
expressões. Stênio (Alexandre Nero) e Drika vão ao estrangeiro num passe de
mágica. Mustafa (Antonio Calloni) é mais um dos personagens estrangeiros desse
ator, novamente numa novela de Gloria Perez. É o mesmo personagem. E começa o
festival de expressões turcas seguidas da tradução em português.
Istambul IS THE NEW Marrocos ou IS THE NEW Índia |
“Salve Jorge” é uma novela requentada, com os mesmos
recursos de novelas anteriores de Gloria. Se essa encerra a trilogia iniciada
com “O Clone”, “Salve” pode ser a pior parte, comum em trilogias. O primeiro
capítulo não mostrou todos os personagens – são quase 80 – e muito menos os
núcleos. O sucesso da trama pode estar calcado justamente nessa fantasia
proposta, no melhor estilo novelão Gloria Perez de ser. Mas é uma missão
difícil e a repercussão não foi positiva: no twitter, poucos foram os assuntos
comentados e a novela estreou com 35 pontos de média, a pior estreia entre as
18 últimas novelas das nove.
Desse
primeiro capítulo de "Salve Jorge", destaque – além da abertura - para
MC Koringa, que emplaca novamente (em sequência, depois de “Avenida Brasil”) um
funk na trilha sonora.